Instrumentação do canal cementário; um novo conceito. 2ª parte

Por Ronaldo Souza

Como é que você chama os espaços mostrados pelas linhas pontilhadas amarela e preta na figura abaixo?

 Forame apical menor e maior pontilhados'

Limite CDC/ponto de constrição e forame respectivamente, não é isso?

Quando se diz “instrumento que se ajusta no forame”, o que você pensa?

Que o instrumento está ajustado no forame, claro.

Onde é o forame na figura acima?

Na linha pontilhada preta.

Posso lhe fazer uma pergunta?

O instrumento que se ajusta naquele local  e que, portanto, teria aquele diâmetro, passaria na porção mais estreita mostrada pela linha pontilhada amarela?

Vamos em frente porque quero lhe mostrar outras coisas.

O Prof. Pécora e seu grupo fizeram alguns trabalhos bem interessantes e que constaram do seguinte.

Testaram varias limas nos canais mesio-vestibulares de molares superiores (leia o artigo aqui). Aquelas que se ajustaram a 1 mm aquém do ápice radicular foram fixadas com Super Bonder. O ápice e a ponta do instrumento foram cortados simultaneamente e o terço apical das raízes foi seccionado. Nessas condições, os terços apicais foram levados ao microscópio eletrônico de varredura.

Você vê algumas das imagens na figura abaixo.

CT de Pécora

Tendo sua as pontas cortadas, é assim que as limas aparecem nas imagens.

Observe que elas estão folgadas, não tocam na maior parte das paredes dos canais.

Em outras palavras, as limas que deram a sensação tátil de que estavam ajustadas a 1 mm aquém estavam, na verdade, folgadas, como mostram as imagens.

Se  a 1 mm aquém, na região tida como de maior constrição do canal, as limas, apesar da sensação tátil de ajuste, estão folgadas, como você acha que elas chegarão no forame?

Forame apical maior pontilhado

A figura 3 A acima é de um trabalho que ainda não publiquei e em 3 B ela “aparece” trabalhada para este texto.

Perceba que a lima (sem a ponta cortada) apresenta o mesmo tipo de relação com o “limite CDC/zona de constrição” (porção escura à sua volta), ou seja, folgada, que mostrei no trabalho do Prof. Pécora (Fig. 2).

Há alguma relação de adaptação dela com as paredes do forame, cujo contorno pode ser visto melhor pelo traço pontilhado em 3 B? Ela está ajustada às paredes? Toca nelas?

Claro que não.

Sendo assim, se eu disser que não existe “instrumento que se ajusta no forame”, você concorda comigo?

Por que você concorda?

Porque percebeu que o instrumento simplesmente não passaria pelas porções mais estreitas do canal (linha amarela na figura 1), se tivesse o diâmetro do forame como mostra o contorno pontilhado na figura 3 B acima.

Faz algum sentido ficar falando de “instrumento que se ajusta no forame”?

Então vamos estabelecer juntos?

Não existe “instrumento que se ajusta no forame”.

Ampliação foraminal

O que significa de fato quando alguém diz que faz ampliação foraminal?

Que ele está ampliando o forame.

Quer coisa mais óbvia?

Mas, perceba; ampliando o forame!

Será que não perceberam que para fazer isso eles terão que “arrebentar” o ápice do dente?

Veja a figura 4 abaixo.

Forame menor e maior 1

Observe as setas amarelas. Em A ela aponta para o local de maior constrição do canal e em B para a lima “ajustada” nele.

As setas brancas em B apontam para os “limites” da reabsorção apical na região do forame, acentuando a divergência de suas paredes. Perceba que assim que a lima passa do local de ajuste (seta amarela) fica completamente “perdida” no forame.

As linhas pontilhadas em C mostram o quanto você teria que alargar o canal naquela porção apical para alcançar os “limites” do forame, mostrados pelas setas em B. A partir do momento em que alcançar o diâmetro do forame é que você vai fazer a ampliação foraminal.

Dá para imaginar o nível de desgaste de estrutura radicular que você terá que fazer para executar a ampliação foraminal?

Você pode executar a ampliação foraminal e quem sabe também o dente, por eventual fratura posterior da sua porção apical, de tão frágeis que ficarão as suas paredes.

Pode-se contra-argumentar dizendo que estou exagerando, por mostrar um caso de reabsorção apical, que acentuou as dimensões do forame.

Faço isso intencionalmente, para evidenciar o desconhecimento que existe sobre um procedimento tão disseminado e este caso clínico cai como uma luva, pela força de suas imagens.

Mas quer pegar um caso normal, sem reabsorção?

Volte à figura 3 e imagine também o nível de desgaste que você teria que fazer para alcançar as paredes do forame (delimitadas pela linha pontilhada) e a partir daí fazer a famosa ampliação foraminal.

É essa recomendação, ampliação foraminal, que vejo fazerem todos os dias, inclusive nessa grande proliferação de vídeos que existe hoje no YouTube falando desse e de outros temas.

Será que sabem do que estão falando?

Há uma real compreensão do procedimento ou são meros seguidores de protocolos, aliás, como alguns gostam tanto de alardear?

A essa altura acho que você já tirou suas conclusões.

Ângelo CT 2'

Confesso que não sei o que significa Física e geograficamente, a ampliação do forame apical não interfere na fisiologia do elemento dental.

Talvez por isso, também não entendo o que quer dizer “a diferença se faz mínima, já que apenas remove-se poucas camadas  ao derredor do forame“.

O que é diferença mínima e diferença de que?

Remove-se poucas camadas de que ao derredor do forame?

Se é ao derredor não é no forame, mas “no espaço circundante, em volta, à volta, em torno”, que é o que significa a palavra derredor.

Assim, remover “poucas camadas (???) ao derredor do forame” é trabalhar nos tecidos circundantes, em volta do forame; nos tecidos periodontais.

O que é “suficiente para eliminar a maior parte das bactérias aderidas às paredes do forame?

O que significa esse amontoado de palavras superpostas sem conexão?

Afinal, amplia-se ou não o forame?

Por outro lado, também não parece interessante dizer que “o desbridamento foraminal é realizado com limas de reduzido calibre utilizado para a limpeza do forame(Leonardo, M. Tratamento dos Canais Radiculares, 2005).

O calibre das limas não deve ser predeterminado, mas sim de acordo com cada caso.

Lima de pequeno calibre no forame

É possível que uma lima de calibre reduzido seja efetiva no caso da figura 4 A, mas não parece que seria no caso da figura 4 B.

A lima deve ser proporcional a cada situação. 

Continuaremos a nossa conversa sobre esse tema.